Pular para o conteúdo principal

O incêndio no Museu Nacional, ascensão de Bolsonaro e a permissividade do erro


(Autor: Professor Caviar)

Desde que um irresponsável e oportunista Francisco Cândido Xavier, depois de investir em literatura fake, deturpar a Doutrina Espírita e pregar ideias reacionárias como "aceitar sofrer desgraças em silêncio", o Brasil passou a sofrer uma sina terrível.

Passou a inverter seus valores, dando mais valor ao supérfluo do que realmente é importante. Aceita que determinadas pessoas cometam erros gravíssimos, sob a ilusão de que isso é "ser gente como a gente", quando se sabe que a gravidade dos erros, para certas pessoas, é medido não pelo respectivo erro em si nem por seus efeitos, mas pelo status social de quem o pratica.

É um país que deixa patrimônios culturais de grandioso valor desaparecerem. Não temos um acervo televisivo de sua fase áurea, pois restaram apenas fragmentos. Somos um país em que as personalidades de grande contribuição cultural, científica e intelectual morrem prematuramente ou no auge de suas atividades. Não damos ouvidos a personalidades que cobram uma compreensão coerente e menos fantasiosa da realidade.

Em compensação, as pessoas se incomodam quando uma subcelebridade ou um ídolo musical popularesco dos mais canastrões fica seis meses no ostracismo. Ficamos apavorados quando políticos originários da ditadura militar podem estar em fim de carreira. Dois feminicidas famosos, um ex-playboy e um ex-jornalista, estão com idade avançada, doentes por conta de antigos descuidos à saúde, e só mencionar essas doenças soa "ofensivo" para determinados setores da sociedade. E ainda essa sociedade se sente pouco incomodada com as atitudes preocupantes de Jair Bolsonaro e seus filhos.

É esse sentimento, de descaso com o que realmente tem valor e um apego doentio para aquilo que nem vale tanto assim é que permitiu que se ocorresse o incêndio no Museu Nacional, no Rio de Janeiro. Uma sociedade que permite a atuação abusiva, parcial e tendenciosa de uma Justiça seletiva, que prefere fechar o cerco contra a candidatura de Luís Inácio Lula da Silva enquanto deixa Jair Bolsonaro, livre, leve e solto, pregando violência e incitando a guerra civil, sem que os juristas pudessem fazer coisa alguma contra ele.

A sociedade brasileira está doente e não é pelos motivos, ao mesmo tempo simplórios e prosaicos, que o "espiritismo" brasileiro, através de suas publicações e palestras, tenta dizer. Não se trata de um "apego automático à matéria" ou "o triunfo do egoísmo e das paixões abusivas", até porque o próprio "espiritismo" é culpado por muitos procedimentos negativos que se vê na nossa sociedade, com Chico Xavier adorado como se fosse um velocino de ouro, quando um sujeito desses, reacionário e deturpador grave da causa espírita, não merece sequer 1% da adoração que recebe de seguidores, adeptos e até de leigos simpatizantes.

Vivemos numa desigualdade de valores e prioridades. Enquanto se chora lágrimas de crocodilo diante de tragédias recentes, como o assassinato da vereadora Marielle Franco e o incêndio no Museu Nacional, as pessoas vão dormir tranquilas quando Jair Bolsonaro prega a prática de homicídio em seus comícios e seu economista, apelidado de "posto Ipiranga", Paulo Guedes (que trabalhou para a ditadura de Augusto Pinochet, no Chile), afirmou que manterá todo o projeto econômico do governo Michel Temer. É bastante aberrante que Michel Temer, extremamente impopular, e o suposto "favorito" Jair Bolsonaro tenham rigorosamente as mesmas propostas, sendo elas ainda mais radicais da parte do segundo.

A sociedade brasileira é tão ignorante, conformista e imprudente que a única noção de "humanismo" que conhecem está no "humanismo de fachada" de "médiuns" como Chico Xavier. Só que, vendo com muita atenção o programa Pinga Fogo da TV Tupi, de 1971, disponível no YouTube, se conclui que até a "bondade" e a "meiguice" tão associadas a Chico Xavier não passam de falácia: no programa, ele se revela reacionário, ranzinza e ainda condenou os movimentos sociais, atacando as organizações de operários, camponeses e sem-teto, o que derrubou o mito de "símbolo de humildade" tão associado ao "médium", que em 1966 já havia acusado os pobres e infelizes espectadores de um circo destruído por incêndio criminoso em Niterói, cinco anos antes, de terem sido "romanos sanguinários", numa demonstração de falta de misericórdia com gente realmente humilde.

Chico Xavier e Jair Bolsonaro são dois lados da mesma moeda. Representam grotescamente paradigmas confusos e vagos de "salvação da humanidade", que inspiram uma idolatria cega, sem motivo lógico, movida pela catarse, que é uma espécie de masturbação emocional combinada com uma sensação de transe que deixa as pessoas incapazes de possuir algum discernimento das coisas. É bom deixar claro que a adoração a Chico Xavier é fruto de um processo perigoso de fascinação obsessiva, risco já previamente alertado pela literatura espírita original.

O apego doentio a Chico Xavier - mesmo a "adoração às avessas", que supõe que o "médium" havia sido "apenas um homem humilde e bom", não escapa a esse sentimento mórbido e nocivo - possui as mesmas condições emotivas que fazem com que não só Jair Bolsonaro saia favorito nas pesquisas eleitorais, como seu filho Flávio ou outro que possua ou esteja associado de algum modo ao sobrenome Bolsonaro garantem alguma virtual vitória nas consultas eleitorais. Não há um motivo lógico que faça com que Flávio Bolsonaro seja grande favorito para representar o Rio de Janeiro no Senado Federal.

O sobrenome Bolsonaro está associado aos valores mais retrógrados que se reconhece na sociedade pós-moderna. Mas o Brasil ainda vive numa mentalidade medieval, na qual os "heróis" são tanto aventureiros políticos com índole militaresca, como Jair Bolsonaro, quanto moralistas retrógrados, porém paternalistas, como Chico Xavier. Ambos parecem ter sido figuras do século XII, mas como aberrações assombrosas eles (mesmo com Chico morto há 16 anos) parecem agir como se fossem donos do futuro do Brasil.

As pessoas precisam rever seus valores. Deixam o Museu Nacional ser destruído pelo fogo, permitem que valores sócio-culturais autênticos se percam e personalidades de grande valor morram precocemente. Mas se apega ao que é retrógrado, medieval, nocivo, e não se incomoda quando Jair Bolsonaro pede para seus defensores saírem matando qualquer um que pareça "petista". Não há um risco de Jair ter sua candidatura banida por causa da incitação à violência e a grande mídia permanece em silêncio absoluto a respeito do caso.

Permitimos o erro, quando vindo de pessoas com status. Aceitamos um governo desastroso como o de Michel Temer, a ponto de sermos impotentes mesmo com o refrão "Fora Temer" na ponta da língua. Repudiamos a Rede Globo, mas muitos de nós aceitamos sua herança cultural, somos herdeiros de tantos pretensos valores trazidos pela emissora dos Marinho, como o "funk", o "sertanejo", os "médiuns espíritas" e até um Bolsonaro cujos seguidores apenas fingem odiar a Globo. Nos resignamos com erros graves e até crimes, quando vindos das elites ou de gente com prestígio, e isso não exclui Chico Xavier, que no fundo nunca foi mais do que um office boy religioso das classes dominantes e da sociedade conservadora.

Triste teimosia da nossa sociedade, que passou a adotar um comportamento de cerca de 45 anos, trocando as bolas em suas prioridades e riscos, em seus traumas e aversões. Um país que transforma um autor de pastiches literários em semi-deus e não consegue aceitar a morte anunciada de velhos feminicidas e, ainda por cima, está feliz em ver um tirano estar cotado para concorrer o segundo turno das eleições presidenciais é um país que precisa se reencontrar nos escombros do Museu Nacional. Porque, com esse incêndio, quem mais saiu queimado é quem mais contribuiu para essa tragédia acontecer, pela própria inversão de valores que assola o Brasil.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Publio Lentulus nunca existiu: é invenção de "Emmanuel" da Nóbrega! - Parte 3

OBS de Profeta Gandalf: Este estudo mostra que o personagem Publio Lentulus, utilizado pelo obsessor de Chico Xavier, Emmanuel, para tentar dizer que "esteve com Jesus", é um personagem fictício, de uma obra fictícia, mas com intenções reais de tentar estragar a doutrina espírita, difundindo muita mentira e travando a evolução espiritual. Testemunhos Lentulianos Por José Carlos Ferreira Fernandes - Blog Obras Psicografadas Considerações de Pesquisadores Espíritas acerca da Historicidade de Públio Lêntulo (1944) :   Em agosto de 1944, o periódico carioca “Jornal da Noite” publicou reportagens investigativas acerca da mediunidade de Francisco Cândido Xavier.   Nas suas edições de 09 e de 11 de agosto de 1944, encontram-se contra-argumentações espíritas defendendo tal mediunidade, inclusive em resposta a uma reportagem anterior (negando-a, e baseando seus argumentos, principalmente, na inexistência de “Públio Lêntulo”, uma das encarnações pretéritas do

Provas de que Chico Xavier NÃO foi enganado por Otília Diogo

 (Autor: Professor Caviar) Diante do caso do prefeito de São Paulo, João Dória Jr., que divulgou uma farsa alimentícia durante o evento Você e a Paz, encontro comandado por Divaldo Franco, o "médium" baiano, beneficiado pela omissão da imprensa, tenta se redimir da responsabilidade de ter homenageado o político e deixado ele divulgar o produto vestindo a camiseta do referido evento. Isso lembra um caso em que um "médium" tentava se livrar da responsabilidade de seus piores atos, como se ser "médium espírita" permitisse o calote moral. Oficialmente, diz-se que o "médium" Francisco Cândido Xavier "havia sido enganado" pela farsante Otília Diogo. Isso é uma mentira descarada, sem pé nem cabeça. Essa constatação, para desespero dos "espíritas", não se baseia em mais um "manifesto de ódio" contra um "homem de bem", mas em fotos tiradas pelo próprio fotógrafo oficial, Nedyr Mendes da Rocha, solidário a

Um grave equívoco numa frase de Chico Xavier

(Autor: Professor Caviar) Pretenso sábio, o "médium" Francisco Cândido Xavier é uma das figuras mais blindadas do "espiritismo" brasileiro a ponto de até seus críticos terem medo de questioná-lo de maneira mais enérgica e aprofundada. Ele foi dado a dizer frases de efeito a partir dos anos 1970, quando seu mito de pretenso filantropo ganhou uma abordagem menos confusa que a de seu antigo tutor institucional, o ex-presidente da FEB, Antônio Wantuil de Freitas. Nessa nova abordagem, feita sob o respaldo da Rede Globo, Chico Xavier era trabalhado como ídolo religioso nos moldes que o jornalista católico inglês Malcolm Muggeridge havia feito no documentário Algo Bonito para Deus (Something Beautiful for God) , em relação a Madre Teresa de Calcutá. Para um público simplório que é o brasileiro, que anda com mania de pretensa "sabedoria de bolso", colecionando frases de diversas personalidades, umas admiráveis e outras nem tanto, sem que tivesse um