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"Cartas mediúnicas" de Chico Xavier eram contribuição à ditadura militar

(Autor: Professor Caviar)

Ainda se está a investigar quem realmente foi a figura de Francisco Cândido Xavier, oficialmente adocicada e trabalhada como um "filantropo" de maneira dramatúrgica. Setores das esquerdas ainda se sentem seduzidos por Chico Xavier, e ignoram que ele havia sido uma das figuras mais conservadoras e reacionárias que passou por toda a História do Brasil.

Seus apelos para a aceitação do sofrimento e da desgraça humana, calcados na Teologia do Sofrimento, corrente medieval da Igreja Católica, eram notórios. A ênfase ao silêncio era como um "AI-5 com açúcar", com o duplo objetivo de evitar questionar sua trajetória, escondendo da memória pública um passado de muito arrivismo (livros fake atribuídos a literatos famosos, fraudes de materialização etc) e de também garantir a supremacia dos valores conservadores e das desigualdades sociais que o "espiritismo" brasileiro finge combater, mas que no fundo apenas diminui seus efeitos mais danosos, para evitar escândalos.

Um dado que se deve considerar é que Chico Xavier tornou-se ídolo religioso pouco após o auge da ditadura militar. Protegido pela mídia conservadora, primeiro a TV Tupi e depois a Rede Globo (que blinda o "médium" até hoje, agora postumamente), Chico Xavier tornou-se o ídolo que conhecemos por três grandes motivos:

1) Neutralizar a concorrência dos pastores pentecostais que usavam a mídia concorrente da Globo para se projetarem (vide Edir Macedo, por exemplo, que mais tarde virou dono da Record), sem que se invista num aparato religioso. Consta-se que a família Marinho resolveu acolher o "espiritismo" brasileiro e, em particular, Chico Xavier, visando competir sobretudo com a Band e Record (que arrendavam mais horários, e hoje a Record é da Igreja Universal) sem que se invista num aparato religioso como o do Catolicismo. Desta forma, o "espiritismo" brasileiro, que nunca foi mais do que um clone da religião católica, praticamente uma repaginação do antigo Catolicismo medieval, consegue se comportar como se fosse uma "Igreja Católica à paisana".

2) Evitar a ascensão de ativistas sociais autênticos. A pressão que a grande mídia faz contra Lula é coisa bem antiga. O sindicalista e, depois, presidente da República, atualmente preso por motivos políticos das elites que retomaram o poder em 2016, estava em plena ascensão, e seu ativismo político representava uma ameaça aos privilégios das elites. Com isso, a mídia hegemônica, a partir da Rede Globo de Televisão, promoveu Chico Xavier como "filantropo", criando uma narrativa atraente que, no entanto, tem um conteúdo terrivelmente conservador: a valorização de paradigmas de caridade que não tragam resultados profundos, mas apenas efeitos paliativos, evitando que os pobres saiam de sua inferioridade social tendo apenas uma "emancipação" limitada, e sem ameaçar os interesses das elites privilegiadas.

3) Promover um moralismo conservador, numa época em que a crise da ditadura militar fez explodirem as convulsões sociais, como o aumento da violência e os crimes cometidos por "pessoas de bem". Desse modo, Chico Xavier foi falsamente promovido como "progressista" por um discurso midiático-religioso que enganou muita gente. O movito é que não há lógica alguma em ver como "progressista" alguém que prega para as pessoas aguentarem o sofrimento em silêncio sem mostrá-lo aos outros, e que chamava o questionamento aprofundado (estimulado por Allan Kardec) de "tóxico do intelectualismo".

Os brasileiros ainda moldam Chico Xavier ao sabor de seus pensamentos desejosos, o que é um erro da mais extrema gravidade. Se recusam a admitir que ele era uma figura ultraconservadora e reacionária, cuja prova contundente foi o programa Pinga Fogo, da TV Tupi, em 1971. Chico permaneceu o mesmo ultraconservador até o fim da vida, apoiando Collor e sinalizando apoio ao PSDB no final da vida.

"ACEITAÇÃO" DA MORTE COMO EUFEMISMO PARA CONSENTIR COM AS MORTES DA DITADURA MILITAR

O fato de Chico Xavier ter tido o auge de seu prestígio na época da ditadura militar deve ser chamado a atenção. Não se trata da projeção de uma pessoa supostamente iluminada como contraste e meio de salvação de um período socialmente bastante negativo. Trata-se, isso sim, da projeção de um ídolo religioso conservador, como meio analgésico de diminuir a revolta e a indignação contra a ditadura militar, forçando a aceitação da mesma sob a desculpa de que "na vida futura será melhor".

O processo das "cartas mediúnicas" é um evento no qual temos que tomar cuidado. Tido como "a maior caridade de Chico Xavier", essa atividade, que se carateriza na divulgação de supostas cartas psicográficas atribuídas a pessoas comuns falecidas, revela uma série de leviandades e até de aspectos bastante perversos.

A prática equivale, essencialmente, à mesma catarse dos espetáculos de leitura de "tábua Ouija" que ocorriam com intensidade entre a Idade Média e o Século XIX, na Europa. O contexto é diferente, mas o clima psicológico também se remete às orgias materialistas do sexo, dinheiro e drogas, só que sem estes elementos. 

A atividade também estimula sentimentos obsessivos em relação aos mortos e a adoração extrema ao "médium" que também é favorecido pelo apelo sensacionalista dessa atividade, que alimenta o poder da imprensa marrom, diante de matéria tão pitoresca e de forte apelo místico-religioso. Podemos até dizer que, com as "cartas mediúnicas", Chico Xavier só ajudou, mesmo, a imprensa marrom (de perfil policialesco e inclinada a reportar casos pitorescos) e, daí, para as páginas de fake news da Internet hoje em dia, devido à afinidade de sintonias com as psicografakes produzidas pelo "médium" desde Parnaso de Além-Túmulo.

O que poucos podem imaginar é que, quando Chico Xavier, usando os nomes dos mortos para produzir mensagens pretensamente consoladoras, usando como pretextos "a vida após a morte" (tese que existe, sim, mas aqui ela é levianamente explorada) e a "vida futura" (desculpa para a aceitação submissa das desgraças e infortúnios presentes), estaria, na verdade, contribuindo para a defesa e a conformação com o poder da ditadura militar.

Evidentemente Chico Xavier não "psicografava" presos políticos assassinados pelos militares. Mas, na medida em que usava mortos comuns para divulgar supostas cartas - cujo conteúdo era fake, estranhamente iniciadas com o bordão "Querida mamãe", e apresentavam problemas quanto às assinaturas, que não combinava com as deixadas em vida pelos mortos, e não raro se via a caligrafia pessoal de Chico Xavier - , a ideia era criar uma resignação com a tragédia humana, de forma a deixar as pessoas confortadas com as mortes provocadas por acidentes, assassinatos e, daí, também pela repressão militar.

Desse modo, por analogia, as pessoas que se conformam com os mortos comuns, em maior parte seus entes queridos, também passarão a se conformar com os mortos da ditadura militar. E a mensagem subliminar de que o sofrimento e a tragédia serão compensados pela "vida futura" era de que as pessoas deveriam, também, aceitar a ditadura militar e esperar que "uma era de paz e bonança" viesse não se sabe quando, talvez na próxima encarnação, num futuro bem distante.

Embora exista vida após a morte e haja o mundo espiritual e a reencarnação, tais coisas, no que se refere aos detalhes, ainda guardam incertezas profundas. E, como as supostas psicografias são fake, devido a fortes indícios de provas, a atividade de Chico Xavier acaba criando uma ilusão de que, sem apresentar provas do testemunho próprio dos espíritos (afinal, as psicografias indicam fortemente que as mensagens eram inventadas pelo "médium"), as pessoas "estão mais felizes" na "outra vida". 

Isso é um meio leviano de forçar a aceitação da tragédia alheia de forma a fazer até com que famílias, que seguem esse "espiritismo" esquizofrênico que é feito no Brasil, cheguem até mesmo a ter expectativas de qual dos filhos irá morrer prematuramente, criando uma perigosa catarse da tragédia humana, equiparada à do sacrifício das tribos primitivas do passado, que jogavam pessoas nas lavas do vulcão como "oferenda aos deuses" e "depuração dos pecados".

Dentro do Brasil ditadorial, as "cartas mediúnicas" de Chico Xavier se revelam um grave embuste feito para forçar do público a conformação com a ditadura militar e suas mortes por diversos motivos, criando sentimentos masoquistas que se tornam certeiros na aceitação de cenários políticos obscuros e trevosos, em troca de uma "vida futura" da qual não temos a menor ideia do que se trata. Em suma, com essas "cartas", Chico Xavier deu uma grande contribuição em prol da ditadura militar que o "médium", comprovadamente, apoiava e pedia, dos seus seguidores, o mesmo respaldo. Chico Xavier abriu o caminho para Jair Bolsonaro e sua turma.

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