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Por que o "espiritismo" brasileiro não assume seu aspecto ultraconservador?


(Autor: Professor Caviar)

A desonestidade está no DNA do "espiritismo" brasileiro, que começou preferindo Jean-Baptiste Roustaing a Allan Kardec. Com o êxito dessa atitude, muito mal dissimulada com falsas psicografias atribuídas ao próprio Kardec, rebaixado a um "fantasma roustanguista", muita dissimulação passou a ser feita, até os dias de hoje, e com maior intensidade a partir do mito de Francisco Cândido Xavier.

Foi através de Chico Xavier que o "espiritismo" brasileiro se consolidou como uma religião ultraconservadora, postura muito praticada mas quase nunca devidamente assumida. Há, claro, as declarações do próprio Chico Xavier no programa Pinga Fogo da TV Tupi, em 1971, cujo teor reacionário, que se encaixaria na boca de um bolsonarista, desafiam o mais empenhado pensamento desejoso, que queria ver no "médium" mineiro uma figura progressista que a realidade nua e crua considera impossível.

Mesmo assim, os "espíritas" não gostam de assumir suas posturas. Dizem que nos bastidores do "movimento espírita" muitos estão preocupados com a associação que se faz da religião ao apoio social à figura do presidente eleito Jair Bolsonaro, relembrando a atuação na FEB durante a Marcha da Família Unida Com Deus pela Liberdade, que reivindicou a ditadura militar.

Oficialmente, o "movimento espírita", embora anti-petista de carteirinha, queria expressar uma postura "neutra", mas a prática mostra que a religião está se aproximando cada vez mais das seitas neopentecostais, no que se diz às pautas ideológicas - como a condenação radical do aborto, mesmo em casos que oferecem risco à saúde da gestante - , e pode formar, com setores conservadores (e hoje minoritários) do Catolicismo, um bloco religioso ultraconservador junto a seitas como a Igreja Universal do Reino de Deus e a Assembleia de Deus.

O "espiritismo" brasileiro tem uma moral ultraconservadora, fundamentada na Teologia do Sofrimento, trazida e apoiada por Chico Xavier desde os tempos de católico assumido. Consiste em apelar para os oprimidos aceitarem sua vida de desgraças, limitações sem controle e outros infortúnios, sob a desculpa de que um "futuro melhor" lhes espera. É para sustentar essa falácia que supostos mundos espirituais, como a "colônia" Nosso Lar, são feitos, ao arrepio da Ciência Espírita, visando devaneios materialistas para forçar a conformação dos oprimidos com a sua infeliz situação.

O "espiritismo" brasileiro não assume sequer que encampou a Teologia do Sofrimento. Tem uma pauta digna de um projeto político dos apoiadores de Jair Bolsonaro, no qual até o homicídio doloso é considerado um "crime culposo" dependendo da "lei de causa e efeito", na qual o assassino vingativo é promovido a "justiceiro moral", enquanto a vítima se torna "culpada" por supostamente reparar dívidas de encarnações passadas. Chegam a dizer que um suicida é "pior" do que certos tipos de assassino doloso.

É uma postura hipócrita. Os "espíritas" costumam ser rigorosos e inflexíveis na defesa de valores morais retrógrados. Mas, quando alguém lhes adverte disso, reagem com medo, se apavoram e se acovardam, dizendo que "não é bem assim que acontece" e acabam desmentindo aquilo que eles disseram na véspera com a mais firme convicção.

É muito comum haver "espíritas" que tentam desmentir isso ou aquilo. Taxativos em primeira hora, correm para desmentir quando são avisados da defesa de posturas retrógradas. São como monstros que não podem ver espelhos para não se assustarem com o próprio reflexo. Fogem para as sombras acovardados pelo aviso alheio.

Tantos "espíritas" pregaram o sofrimento, desde Chico Xavier ao mais comezinho palestrante do interior de Minas Gerais ou São Paulo, com reflexos em chiquistas fora do Brasil (uns poucos, aliás). No primeiro momento, são inflexíveis: defendem que a pessoa "aguente o sofrimento em silêncio", "ore para Deus, de preferência, calado", "ame suas desgraças como se ama uma mulher" e "inútil se arrepender dos pecados diante do mar de adversidades".

Diante dessa pauta cruel, que faz seus pregadores, na primeira ocasião, estufarem seus peitos com essa moral tão severa, na medida em que surgem as primeiras advertências, os pregadores orgulhosos de antes reagem com choros, desculpas, tentativas de desmentimentos. Até internautas correm mandando respostas dizendo, na sua natural hipocrisia, que "tem que ouvir o outro lado", como se o dito não tivesse sido dito.

Esse acovardamento também se deu quando o "espiritismo" brasileiro passou a apoiar as passeatas do "Fora Dilma" como se fossem o "início da regeneração da humanidade" e a Operação Lava Jato como um trabalho "intuído por benfeitores espirituais". Quando se constatou que os "espíritas", com tudo isso, apoiaram o golpe político de 2016 e, por conseguinte, a campanha estranhamente vitoriosa de Jair Bolsonaro (que tinha em mãos um lema parecido com o de Chico Xavier, "Brasil, acima de tudo, Deus, acima de todos", equivalente a "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho"), eles recuaram, covardes.

Os "espíritas" são ultraconservadores, mas precisam manter uma imagem agradável aos progressistas. Tentam criar um lobby para aparecer até no Brasil 247 (portal de esquerda). Mas o conteúdo conservador é severo demais para estar em boa conta com esquerdas, até porque é forte demais o apelo de "aceitar o sofrimento sem queixumes" de Xavier.

Portanto, é bom o "espiritismo" brasileiro jair se acostumando com sua imagem ultraconservadora. É consequência natural da raiz roustanguista e da trajetória do reacionário "médium" Chico Xavier. É inútil defender ideias retrógradas e, depois, não assumir, ficar triste quando alguém identifica tais valores a ideologias ultraconservadoras. O acovardamento só é sinal de desonestidade e falta de sinceridade consigo mesmo. Os "espíritas" precisam parar de agir como o monstro que foge do espelho, e assumir seu reacionarismo quando as ideias que defendem assim se apresentam.

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