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Banalização do erro une chiquistas e bolsonaristas


(Autor: Professor Caviar)

Tomemos muito cuidado com a frase de Francisco Cândido Xavier: "O sentimento de ódio é um processo de auto-obsessão". Para o chiquista aloprado jogar Chico Xavier no balaio das esquerdas, assim de maneira tola, é um pulo, sem que se observem nuances e contextos diversos que fazem o reacionarismo doentio do "médium" - que só eventualmente era explicitamente manifesto como no Pinga Fogo da TV Tupi, em 1971 - parecer estranho para muita gente.

Consta-se que a Natureza molda animais e plantas traiçoeiros com uma aparência que não parece agressiva. A raposa é um animal de feições graciosas, seus passos e o comportamento aparentemente calmo podem parecer que esse bicho pode ser domesticável. Mas não é: a raposa é considerado um animal selvagem e a metáfora da raposa que cuida do galinheiro corresponde à armadilha de pessoas que deixam suas coisas e assuntos serem cuidados por seus algozes, pois as raposas são predadoras das galinhas.

A trajetória de Chico Xavier, lembremos, tem pontos bastante negativos. Ainda vamos falar do fato de que Chico nunca perdoou, por exemplo, Humberto de Campos, pela resenha jocosa que fez em 1932 sobre Parnaso de Além-Túmulo. E o jeito malicioso que Chico Xavier usou para se apropriar do nome do autor maranhense fez muitos brasileiros acreditarem que essa apropriação era "justa e admirável", quando se tratava de uma revanche das mais deploráveis.

Chico Xavier fez juízo de valor cruel contra as vítimas do incêndio de um circo em Niterói, acusando-as de terem "pagado pelo que deviam", por "terem sido romanos sanguinários numa antiga encarnação". O juízo de valor, jogado na conta de - advinhem vocês! - Humberto de Campos, mal disfarçado pelo codinome "Irmão X" (de uso interno, para efeitos jurídicos; dentro do "movimento espírita", atribuía-se, na cara dura, ao próprio Humberto), foi feito sem o menor fundamento teórico nem científico.

Outra coisa foi Chico Xavier se irritar - sim, ele se irritava - com a desconfiança dos amigos de Jair Presente quanto às pretensas psicografias, que não iludiram essa turma. Chico não gostou das críticas motivadas por tal desconfiança e, rispidamente, chamou essa desconfiança de "bobagem da grossa", num comentário bastante ranzinza.

Não devemos ver essas questões de "ódio" e "amor" dentro do maniqueísmo azul-versus-rosa de Damares Alves. Nem todos que aparentemente "reprovam" o ódio são progressistas. O esquerdista que prestar atenção nas ideias de Chico Xavier vai se decepcionar feio, e ficará terrivelmente desapontado com o conservadorismo escancarado que foi manifesto em suas próprias palavras ou nas palavras que Chico atribuiu a espíritos mortos.

Temos que ter cuidado com o pensamento binário que contamina tanto direita quanto esquerda. É esse pensamento binário que mostra nuances negativas de certas pessoas que parecem progressistas, mas não são. As pessoas de esquerda leem textos às pressas e sem pensar e, com isso, acabam tendo como seus "heróis" intelectuais, religiosos e esportistas de direita que expressam algum apelo de tendencioso populismo.

"MÉDIUNS" AGORA "PODEM ERRAR"

Com a multiplicação de denúncias e queixas a respeito dos chamados "médiuns espíritas", sem poupar "gente tarimbada" como Chico Xavier e Divaldo Franco, os "espíritas", sem poder esclarecer ou desmentir a respeito de tantos incidentes incômodos, que põem xeque-mate à reputação divinizada de seus ídolos, resolvem serem lacônicos e agora "admitem imperfeições" nos seus adorados.

"Temos que admirar Chico e Divaldo não como divindades que passaram pela Terra, mas como figuras humanas imperfeitas e passíveis de erros", virou o novo pensamento corrente, como uma forma de fazer idolatria pelo avesso, através de um verniz de "simplicidade, humildade e imperfeição".

Isso tudo ocorre quando os atos errados, através do governo Jair Bolsonaro, se tornam tão banais que dão ao povo a falsa impressão de que cometer erros, mesmo os mais graves, é "tão natural" quanto o nascer do Sol. O irritante refrão "Quem nunca errou na vida?" mais parece uma apologia ao erro do que uma postura consciente ou autocrítica do ato equivocado e quase nunca representa remorso, sendo mais uma reivindicação de permissividade.

É o "espírito" do momento. É tanto erro que o ato de errar virou "receita de sucesso". E criou uma grande inversão de valores: pessoas com uma conduta mais correta são espinafradas e esnobadas, enquanto pessoas que cometem gafes e até crimes viram "gente como a gente".

É o cenário que propicia a busca de celebridade até da parte de assassinos como Guilherme de Pádua e Suzane Von Richtofen, hoje faturando como subcelebridades a "vender polêmica" nas redes sociais. A sordidez humana virou uma "virtude", e para quem acha que o bom-mocismo de Chico Xavier está fora desse contexto, está redondamente enganaado.

O mito de Chico Xavier foi desenvolvido nesse contexto de permissividade, que há 40 anos estava latente no inconsciente coletivo daqueles tempos da ditadura militar. Devemos lembrar que o mito de Chico Xavier, tal como hoje conhecemos, foi "higienizado", mas a verdade é que ele se ascendeu através das confusões que ele criou, através de sua literatura fake e de outros incidentes que só causaram irritações e revolta nos outros.

Ele é o ídolo religioso exato dessa sociedade do "Quem nunca erra?". Um suposto "espírito de luz" que aprontou confusões de propósito, mas, de forma irresponsável, adotou o vitimismo e se supôs "perseguido por bestas-feras", acusando (sem fundamento) os seus críticos de "juízes violentos e impiedosos".

É o típico mito do cafajeste. Ou do moleque que atira na vidraça da casa do vizinho e corre, e, quando é pego, posa de coitadinho dizendo que agiu sob o mando de alguém. E o pior é que temos, para complicar as coisas, a ideia de que perdoar é liberar o faltoso a fazer o que quiser, como se misericórdia e permissividade fossem a mesma coisa.

Chico Xavier deturpou o Espiritismo? Deixe para lá! Chico Xavier produziu literatura fake? Deixe para lá! Chico Xavier jogou conceitos alucinados como a ideia de que extraterrestres substituirão os intelectuais que morrerão em massa na Terra? Deixe para lá! Chico Xavier defendeu a ditadura militar? Deixe para lá! Chico Xavier defende a Teologia do Sofrimento? Deixe para lá!

Essa permissividade condiz com o momento de hoje, mesmo quando brasileiros se assustam com as comparações entre Chico Xavier e Jair Bolsonaro, pelas simbologias aparentemente opostas que cada um representa. Melhor prestar atenção em suas biografias, porque as formas com que Chico e Jair se ascenderam, reconhecidas as diferenças de contexto, são surpreendentemente idênticas.

A própria permissividade é atribuída tanto ao governo Jair Bolsonaro, ao qual se deixa seguir com seus escândalos vergonhosos, e ao legado de Chico Xavier, com seus inúmeros pontos, digamos, nebulosos. Tudo isso vem de um mesmo inconsciente coletivo, que adora essa farra de deslizes morais e muita confusão.

Os "isentões espíritas", espécie de "bolsomínions" da doutrina, pela persistência que tem em argumentar o ilógico, falam tanto que "os médiuns são, sim, imperfeitos, e podem errar", mas eles cometem uma grande contradição. Eles consideram Chico e Divaldo, entre outros, "mestres" mesmo com suas falhas imensas (das quais envolve a deturpação do legado espírita original), quando eles nada têm de ensinar de positivo e transformador para nossas vidas.

Eles acabam seguindo a farra generalizada que, usando a frase "Quem nunca erra?", na verdade está fazendo a defesa escancarada da omissão e da irresponsabilidade. A ideia não é assumir realmente os erros, mas se livrar das punições e outros efeitos drásticos que atos equivocados produzem. É como o mau aluno que só tira notas baixas nas provas, mas apela ao professor para passar de ano e, de preferência, sem entrar na recuperação escolar.

A banalização do erro, portanto, é, também, uma expressão de impunidade. E lembremos que Chico Xavier foi um dos maiores beneficiados pela impunidade da Justiça, porque sua apropriação leviana e oportunista do nome de Humberto de Campos - ato reprovado por Allan Kardec, que condenava o uso de "nomes ilustres" pelos "médiuns" para causar impressão na população - foi liberada pela seletividade dos juízes, a partir da decisão do juiz suplente João Frederico Mourão Russell, em 1944. Ele deu sinal verde para as farras que vemos nessa sociedade errante chamada Brasil.

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