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Apologia ao sofrimento faz "espiritismo" brasileiro desmerecer associação com a caridade


(Autor: Professor Caviar)

Oficialmente, o "espiritismo" brasileiro é considerado a "religião da caridade". No entanto, seu moralismo, de essência punitivista, sempre apela para as pessoas suportarem, até mesmo com alegria, sua própria desgraça e aguentar os infortúnios até não se sabe quando. E, para piorar, há ainda apelos para que haja mais infortúnios na próxima encarnação, como juros exorbitantes a serem pagos por quem não tem condições de custear tais "dívidas" surgidas do nada.

As pessoas estranham isso, mas é só prestar atenção nos textos que os pregadores "espíritas" escrevem ou falam, a partir das ideias de Francisco Cândido Xavier, para saber da triste constatação: o que conhecemos como Espiritismo, no Brasil, está mais próximo da Teologia do Sofrimento importada do Catolicismo medieval do que dos postulados originais trazidos por Allan Kardec, pedagogo que aqui é reduzido a um fantoche que serve de brinquedo para os deturpadores doutrinários.

Agora, pensemos bem. Essa tese da "aceitação do sofrimento", que leitores "espíritas" apressados, mas que se acham "cheios da razão", consideram "progressista" e "esperançosa", é na verdade uma perversidade que os "espíritas" transmitem de maneira hipócrita: num primeiro momento, fazem apologia ao sofrimento humano com palavras que julgam diretas e literais. No segundo momento, quando sofrem má repercussão, tentam desconversar e desmentir a si mesmos, alegando que o que eles falaram era uma "força de expressão" ou uma "metáfora".

Sabe-se que o acúmulo de adversidades encaradas sem controle, que exigem sacrifícios acima dos limites de cada pessoa para serem superadas, é uma grande perversidade. Imagine um morador de rua, aconselhado a procurar emprego, ter que caprichar no vestuário e em todo um teatro de encenação só para ir a uma entrevista de emprego que dificilmente lhe garantirá um trabalho. Só para ir a uma entrevista dessas, é necessário gastar dinheiro, material de limpeza pessoal, negociar um chuveiro em algum bar ou pensão, comprar roupa e calçados, entre outras coisas. E imagine fazer todo esse investimento com o dinheiro que não se tem.

Isso é uma crueldade que os moralistas não percebem e que mesmo os "espíritas" que se dizem "progressistas" nos fóruns de Internet, mas que se demonstram moralistas doentiamente reacionários, também se recusam a admitir.

Para esse pessoal, pimenta nos olhos dos outros é refresco. Sofrer adversidades sem controle, humilhações de todo tipo, oportunidades que lhes escapam das mãos, tragédias vindas do nada, estragos diversos etc, não é moleza e ficar feliz com a desgraça do outro, mesmo usando a desculpa de que "este, sim, está perto do Céu", é de uma crueldade sem nome.

CARIDADE A MENOS

O que se deve levar em conta é que o moralismo "espírita", na medida em que apela para os sofredores suportarem suas desgraças "com resignação e, de preferência, alegria", está cometendo caridade a menos, o que significa uns milhares de pontos retirados da famosa reputação de "religião da bondade" que a religião de Chico Xavier tanto goza oficialmente.

Isso é muito grave. Como se não bastasse a aparente filantropia do "espiritismo" brasileiro, e mesmo a de Chico Xavier em particular, nunca ultrapassarem os limites fajutos do Assistencialismo - a "caridade" que causa mais adoração que ajuda aos mais necessitados e cujos resultados sociais são fracos e pontuais - , isso significa que o número de ajudados que promove a reputação "caridosa" dessa religião é muitíssimo baixo.

É muito preocupante. Afinal, se um punhado de pessoas é ajudado precariamente, só uns gatos pingados ajudados de maneira um pouco acima do medíocre - as tais "ajudas pontuais" que mais lembram quadros do Caldeirão do Huck - , o que dizer então a quem não é ajudado, mas é aconselhado a "segurar a barra" diante de uma avalanche de adversidades?

Vamos fazer um cálculo hipotético. Digamos que um grupo de 400 pessoas foi supostamente atendido pelo "espiritismo" brasileiro. Destes, digamos que 10%, 40 pessoas, foram ajudados pela suposta "caridade", o Assistencialismo (embora creditado como Assistência Social). As demais 360 são aconselhadas a "segurar a barra", a "amar o sofrimento" ou a "sacrificar demais, metendo a cara, dando murro em ponta de faca, para vencer na vida".

40 pessoas são ajudadas precariamente. O mérito da "caridade" baixa pela metade, porque as ajudas atingem resultados medíocres, aos quais o que mais importa é a glorificação do "benfeitor", geralmente um "médium" ou um "palestrante", que, por mais "imperfeitos e falíveis" que são considerados por seus seguidores e até por simpatizantes "leigos", continuam sendo alvo de adoração divinizada.

Com isso, o mérito da "caridade" diminui em 50%. Se a pontuação fosse para um ponto por cada pessoa ajudada com plenitude, então ela cai, na melhor das hipóteses, para meio ponto. Isso significa que as 40 pessoas ajudadas de maneira precária dão apenas 20 pontos, diminuindo o mérito. E isso quando critérios mais rigorosos de ajuda aos mais necessitados não adotarem uma pontuação ainda menor. Aí podemos dizer que a "caridade espírita" pode cair para índices de até 80%.

E as 360 pessoas que são aconselhadas, por livros e palestras, a "aguentar suas desgraças"? Isso tudo traz um aspecto ainda mais grave. São pessoas que DEIXAM DE SEREM AJUDADAS pelos "espíritas". E como esses apelos vêm, sobretudo, dos livros de Chico Xavier, a responsabilidade dele por isso derruba o mito, repetido como um refrão surrado, de que "o médium fez caridade". E derruba da forma mais drástica que se pode imaginar.

Se verificarmos que, do grupo de 400 pessoas, uma pessoa ajudada precariamente vale meio ponto e uma pessoa que deixa de ser ajudada é um ponto a menos (-1), o que poderia render, normalmente, 400 pontos se houvesse caridade de verdade, segue um cálculo humilhante para os "espíritas".

Se 40 pessoas foram ajudadas precariamente, são 20 pontos. Mas sendo que 360 pessoas não foram ajudadas e foram aconselhadas a "continuar sofrendo", então são 360 pontos negativos. Diante disso, 20 pontos se tornam apenas um pálido atenuante, mas que não merece a adoração, mesmo sob ressalvas, que se dá ao "espiritismo" brasileiro.

Nesse cálculo, 340 pontos negativos já são suficientes para derrubar o mito do "espiritismo" brasileiro como a "religião da caridade". Não há ressalvas que possam, através de suposto reconhecimento de erros, relativizar a situação. Até porque fazer apologia ao sofrimento humano, mesmo usando de argumentos referentes à "fé em Deus" ou a "esperança no futuro", é sempre cruel. Aliás, é ainda mais cruel quando essa visão sádica se esconde pelos apelos agradáveis da religião.

Afinal, não é porque se coloca açúcar em um veneno que o faz tornar-se saudável. Não é esse açúcar que eliminará o caráter peçonhento da bebida fatal. Da mesma forma, falar em Jesus para defender o sofrimento extremo do outro é cruel, até porque se olha o martírio do famoso nazareno sob os olhos punitivistas de Pôncio Pilatos, ainda que citando a "misericórdia de Deus". Até porque, para os "espíritas", pouco importa se o "socorro de Deus" vem na velhice ou na próxima encarnação, e aí o caráter caridoso praticamente se elimina diante dos apelos pela "aceitação do infortúnio".

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