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Malcolm Muggeridge foi o Steve Bannon de Chico Xavier

 (Autor: Professor Caviar)

Com a vitória eleitoral de Jair Bolsonaro motivada pelas campanha fake do marqueteiro de Donald Trump, Steve Bannon, dono da Cambridge Analytica, nos lembremos da campanha que transformou outro arrivista, Francisco Cândido Xavier, em um semi-deus defendido pelos seguidores e simpatizantes fanáticos e motivados pela fascinação obsessiva exercida pela imagem do "bondoso médium".

Pois essa imagem, que agrada a muitos e pega desprevenidas até pessoas com algum relativo grau de esclarecimento - um perigo que já havia alertado, com antecedência, o professor Allan Kardec - , foi um discurso muito engenhoso produzido por outra figura de forte atuação midiática, o jornalista inglês, católico e ultraconservador, Malcolm Muggeridge (1907-1990).

Foi Muggeridge que adocicou a imagem de Madre Teresa de Calcutá, uma religiosa reacionária que depois foi denunciada por maltratar doentes e pobres nas casas mantidas pela sua organização Missionárias da Caridade e de desviar o dinheiro da caridade para os cofres dos sacerdotes do Vaticano (daí sua "santificação", motivada por interesses financeiros a partir de um suposto milagre associado a uma intoxicação alimentar de um engenheiro de Santos que foi creditada como "câncer terminal"). Essa suavização de imagem se deu no documentário Algo Bonito para Deus (Something Beautiful for God), de 1969.

É claro que, diferente de Steve Bannon, que obteve contatos com o filho de Jair Bolsonaro, o deputado federal eleito por São Paulo, Eduardo Bolsonaro, e atuava na propagação de fake news no WhatsApp, Muggeridge não contribuiu diretamente para promover Chico Xavier. Mas isso não faz muita diferença, porque a influência de Muggeridge se deu de uma forma ou outra na promoção da imagem de Chico, um arrivista acusado de vários escândalos, incluindo literatura fake, apoio a fraudes de materialização e defesa de ideais bastante reacionários.

Isso porque, na época da ditadura militar, em que as convulsões sociais fizeram a sociedade conservadora querer apelar para um ídolo religioso ecumênico para tentar salvar o regime dos generais - que o próprio Chico Xavier atribuiu como "construção de um reino de amor", apenas "punindo subversivos para evitar o caos" - e desenvolver um paradigma de "caridade" que evitasse ameaçar o privilégio das elites, a Rede Globo, aliada do governo militar, resolveu usar o roteiro de Muggeridge para renovar a imagem do "médium" de Pedro Leopoldo e Uberaba.

O roteiro é o mesmo e lembra sinopse de novela. O "filantropo" chega a um local pobre, é acolhido pela multidão, pega bebê no colo, cumprimenta pobres sentados no chão, entra numa suposta casa de caridade, visita aposentos, cumprimenta doentes nos leitos, acompanha crianças tomando sopa, vai ao salão principal e, dando entrevistas coletivas, fala frases de efeito que são tidas tendenciosamente como "filosóficas".

A partir desse roteiro de Muggeridge, Chico Xavier, a exemplo de Madre Teresa, tornou-se um produto para consumo da fé religiosa, sendo alvo de idolatria exageradamente emocional, que chega ao ponto do fanatismo cego, embora esta sensação extrema nunca seja assumida por seus crentes, pelo aparato de modéstia e humildade que esse discurso fabrica.

O discurso foi montado pela Globo para vários objetivos: neutralizar a concorrência com os pastores evangélicos neopentecostais, como Edir Macedo e R. R. Soares, que usavam a televisão para atrair fiéis, evitar também a popularização do então sindicalista (e hoje ex-presidente) Luís Inácio Lula da Silva e criar um paradigma de "filantropia" que tentasse tranquilizar e assegurar as pessoas de que "algo estava sendo resolvido" dentro dos limites ditatoriais.

O discurso de Muggeridge foi inteiramente usado para promover Chico Xavier, e, embora esse processo tenha sido indireto, a influência do jornalista inglês da BBC foi muito grande. A ideia de promover ídolos religiosos a partir de um habilidoso discurso supostamente humanista foi uma estratégia que garantiu a todos a ilusão de que o significado da "caridade" reside no suposto benfeitor, e não nos resultados alcançados.

O Brasil nunca se desenvolveu dignamente a partir de Chico Xavier, como a Índia também não virou país emergente nas mãos de Madre Teresa. Outros personagens é que tentaram promover relativos progressos sociais, fora do âmbito religioso, e ainda assim esses resultados foram muito frágeis. Brasil e Índia passaram a estar entre os três países mais problemáticos do bloco econômico BRICS, uma vez que só Rússia e China conseguem algum desenvolvimento mais significativo. Brasil, Índia e África do Sul continuam penando e até sucumbiram a retrocessos sociais diversos.

O mais irônico nos últimos tempos é que os rivais de 40 anos atrás se aproximaram através de interesses comuns. O "espiritismo" de Chico Xavier cada vez mais se afina com os ex-inimigos neopentecostais na agenda reacionária que conduziu o golpe de 2016 e a vitória de Bolsonaro. Pautas como a condenação radical ao aborto e o apoio a manifestações golpistas como as passeatas do "Fora Dilma" e a Operação Lava Jato - neopentecostais e "espíritas" manifestaram o mesmo grande apreço pelo juiz Sérgio Moro e seus asseclas - , uniram Edir Macedo, R. R. Soares e o legado de Chico Xavier.

Além disso, a vitória de Bolsonaro trouxe revelações sobre Chico Xavier que dissolvem, como a água do mar atingindo um castelo de areia, a imagem "adocicada" que foi montada em favor do "médium". As ideias trazidas em livros e depoimentos de Chico Xavier apresentam profunda analogia com as ideias apresentadas pela reforma trabalhista, pela reforma previdenciária e pela Escola Sem Partido. Só na reforma trabalhista, o aumento da carga horária, a redução de encargos trabalhistas e a flexibilização do acordo entre patrões e empregados está em perfeito acordo com as ideias de Chico Xavier, o que pode ser confirmado em suas próprias palavras.

Além disso, a literatura fake das supostas psicografias - que usurparam, de maneira vergonhosa, as memórias de autores diversos como Humberto de Campos, Olavo Bilac, Augusto dos Anjos, Castro Alves e até Auta de Souza - foi um precedente que, através de energias vibratórias, abriu caminho para as fake news, ajudou a criar as condições psicológicas que permitiram a vitória eleitoral de Jair Bolsonaro.

E isso quando se constata que a "profética" frase "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho", na verdade, nunca passou a previsão de um lema bolsonarista de conteúdo surpreendentemente similar: "Brasil, Acima de Tudo, Deus, Acima de Todos". Essa revelação, bem próximo à "data-limite" de 2019, choca muita gente que acreditava que o "médium" mineiro era progressista. Chico era, na verdade, um reacionário convicto, ao longo de toda sua vida. Daí as energias favoráveis à vitória de Bolsonaro.

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