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Caso João de Deus se deve à permissividade do "espiritismo", a partir de Chico Xavier

(Autor: Professor Caviar)

"O Chico Xavier foi, sem dúvida, uma daquelas pessoas que Deus colocou no meu caminho, para me fazer refletir sobre a vida, suas dificuldades, seus desencontros, a agir e pensar nos meus irmãos como se fosse eu próprio. Simplesmente ele me ensinou a amar". A frase foi dita pelo "médium" João Teixeira de Faria, o João de Deus, em entrevista à revista Isto É, de 31 de maio de 2018, cerca de seis meses antes de estourar o escândalo de denúncias de assédio sexual.

Hoje as denúncias se ampliam em acusações de ocultação de patrimônio financeiro, de produção sem autorização de remédios na farmácia da Casa Dom Inácio de Loyola, porte ilegal de arma e outros crimes, sem falar dos de charlatanismo e exercício ilegal da medicina. O charlatanismo envolveu até dois casos de mortes de doentes que o "médium" não conseguiu curar com suas supostas cirurgias mediúnicas, feitas pelo mesmo caráter duvidoso de Zé Arigó (1921-1971), que dizia receber o espírito do médico alemão Adolph Fritz, o "Dr. Fritz", que teria socorrido soldados na Primeira Guerra Mundial.

João de Deus tornou-se o primeiro grande escândalo no "espiritismo" brasileiro depois que a religião passou a viver de absoluta blindagem da grande mídia e de setores influentes da sociedade, como a comunidade acadêmica e o meio jurídico. Oficialmente, não se reconhece, entre outras coisas, que o que se conhece como "espiritismo" no Brasil é deturpado e mesmo os devaneios mais catolicizados são creditados como "de acordo com os postulados espíritas originais".

Mas, com os escândalos, a blindagem começa a cair. É claro que isso é somente o começo, pois o "espiritismo" brasileiro, na verdade, criou as condições para tamanha permissividade. Desde que as traições em relação aos ensinamentos espíritas originais foram feitas, trocando Allan Kardec por Jean-Baptiste Roustaing (ou J. B. Roustaing), o "espiritismo" brasileiro virou um vale-tudo religioso, onde se chegava ao cinismo de romper com a lógica kardeciana através de falácias como "é preciso ver com os olhos do coração" e "certas coisas que soam absurdas é porque escapam da compreensão humana na Terra".

Daí parecer cruel dizer que o escândalo de João de Deus vai chegar a Chico Xavier, como se um tsunami se formasse em Abadiânia e desaguasse em Uberaba, a seis horas e meia da cidade goiana. Mas isso é realista e a memória curta fez muitos brasileiros esquecer que, por trás da imagem adocicada de Chico Xavier, que chega aos níveis da mais escancarada pieguice, há aspectos negativos que envolvem o "médium" mineiro e que o fizeram o João de Deus de seu tempo. A bênção que Chico deu no "médium" goiano tem muito mais do que uma associação formal, mas uma potencial cumplicidade e apoio.

O apoio de Chico Xavier à fraude de materialização de Otília Diogo é um escândalo que tentaram abafar. As obras "psicográficas" tem fortes indícios (com farta presença de provas) de atividade fake, em muitos casos com opiniões extremamente reacionárias que Chico não queria ver associadas a ele mesmo. Chico Xavier também teria combinado que os lucros de seus livros seriam para Antônio Wantuil de Freitas, presidente da FEB, mas tirou o corpo fora quando o acordo foi revelado em 1969. 

Tem mais. O "fraternal abraço" ao filho de Humberto de Campos teria sido uma forma de assédio moral para evitar novas ações judiciais. E as "cartas mediúnicas", entre várias perversidades, eram uma forma de espetacularizar a morte, promovendo o sensacionalismo e fazendo o "médium" obter prestígio às custas da tragédia alheia.

Há tantos e tantos aspectos negativos em Chico Xavier, que a narrativa que o trata com uma abordagem dócil e agradável - mas fantasiosa, embora esta abordagem se imponha a todo custo à realidade dos fatos - , que mesmo as "lindas frases do médium" não têm beleza alguma, sendo apenas uma combinação malandra de trocadilhos que expressam moralismo retrógrado, fundamentado na medieval Teologia do Sofrimento.

A partir de Chico Xavier, o "espiritismo" virou um vale tudo. Virou um "reino da fantasia" de fazer a Disneyworld parecer científica de tão realista. Cada "médium" escolhe o morto que quiser, escreve mensagem em nome dele, e muita gente acredita. A lógica é jogada no lixo e imagina-se que, no mundo espiritual, os artistas perdem seu próprio talento e coisas absurdas parecem ter algum sentido de ser. A cegueira que o "olhar do coração" causa também é muito grande. E a "caridade" feita pela religião "espírita" beneficia mais os supostos benfeitores do que os mais necessitados, e produzem mais adoração religiosa do que progressos humanos.

A partir de Chico Xavier, criou-se uma escola desastrada de mediunidade, na qual as lições kardecianas foram jogadas fora. Em contrapartida, aspectos negativos alertados em O Livro dos Médiuns se tornaram a "prática espírita" e a suposta "ciência espírita" virou um engodo que envolve esoterismo e compreensões superficiais e pedantes de assuntos científicos, trazidos sem o menor esforço de profundidade e honestidade intelectual.

Muita coisa vai surgir e não serão só casos de assédio sexual. Haverá tantos escândalos, além daqueles que envolveram o próprio Chico Xavier e que "repousam" no esquecimento, tal como um vulcão adormecido. Mas como não se pode ocultar a verdade por muito tempo, a imagem de Chico como uma "fada-madrinha do mundo real", mas com níveis de adoração que superam as das princesas da Disney, em pieguice, sonhos e idealização, irá ruir um dia.

Isso causará muita dor naqueles que ainda insistem na imagem de Chico Xavier rodeado de flores, envolto em coraçõezinhos ou com sua cabeça mesclada a um cenário de céu azul. O próprio fato de Chico ter sido um gravíssimo deturpador do Espiritismo é um fato que virá à tona, e não podemos esquecer da gravidade extrema que é um suposto discípulo desviar das lições de um mestre. Só a desonestidade intelectual e a traição doutrinária já são graves erros de Chico Xavier e desmerecem totalmente a adoração que ele tanto recebe de seus seguidores e simpatizantes.

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