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Como se dá a postura "dúbia" do "espiritismo" brasileiro?

(Autor: Professor Caviar)

O "espiritismo" brasileiro, na sua fase atual, é uma religião de duas caras. Pratica igrejismo mas se traveste de ciência. Bajula Allan Kardec com todas aquelas alegações tipo "ele analisou com muita propriedade" ou "ninguém melhor que ele para analisar isso e aquilo", mas depois exalta as mistificações de Francisco Cândido Xavier e Divaldo Pereira Franco.

Isso é um reflexo do Brasil de hoje. O "espiritismo" é cheio de contradições, como a contradição é a inclinação de muitos brasileiros. Tivemos uma ditadura militar que começou se proclamando "revolução democrática". Tivemos, recentemente, um golpe jurídico-parlamentar, sob o apoio da mídia, que deu fim ao governo progressista de Dilma Rousseff, substituído pelo retrógrado governo de Michel Temer, que se proclama "de salvação nacional" e se diz instaurado "dentro da normalidade democrática e legal".

Há muitos que adoram ser contraditórios, porque podem ao mesmo tempo serem retrógrados e embarcarem em alguma nova onda. Supostos vanguardistas de mente atrasada são o típico produto do "jeitinho brasileiro". E o "espiritismo" brasileiro, que se construiu nas bases do Catolicismo do Brasil colonial, herdeiro do Catolicismo português que mantinha valores e práticas medievais, é um claro exemplo disso.

Nos últimos 40 anos, essa postura contraditória se consolidou com a crise do roustanguismo, fazendo com que o "movimento espírita" deixasse de assumir sua admiração e apreço por Jean-Baptiste Roustaing. Oficialmente, Roustaing está superado e se tornou até um desconhecido para gerações mais recentes de "espíritas".

E por que existe esta postura "dúbia", que bajula Allan Kardec e segue Chico Xavier? O que faz o "movimento espírita" dedicar uma vela ao cientificismo e outra ao igrejismo? O rol de contradições revela os vícios que transformaram o "espiritismo" numa das piores religiões do país, ao lado do obscurantismo das seitas neopentecostais, que controlam a "bancada da Bíblia" no Congresso Nacional e têm entre seus representantes os incômodos Eduardo Cunha e Jair Bolsonaro.

De um lado, narrativas de "estorias lindas de amor e superação", que mais parecem narrações de milagres católicos. De outro, citações aparentemente corretas, mas um tanto pedantes, de personalidades científicas, como Isaac Newton, Galileu Galilei e Albert Einstein. De um lado, conhecimentos trazidos de estudos de Allan Kardec sobre mediunidade. De outro, invencionices baratas sobre o mesmo tema trazidos por Chico Xavier e Waldo Vieira usando o nome de André Luiz (que poucos se lembram ter sido o nome de um falecido irmão do "médium" de Pedro Leopoldo).

Essa postura "dúbia", atualmente a corrente que conduz o "espiritismo" brasileiro, procura um falso equilíbrio entre o cientificismo e igrejismo, distribuindo os assuntos conforme os contextos, dentro de uma falsa inclinação à defesa da "fraternidade".

Portanto, o "espiritismo" tenta dar um aparato de coerência quando distribui, em ocasiões "específicas", onde deve ser apreciada a ciência e onde é apreciada a fé religiosa. Um falso equilíbrio que permite o convívio de contradições desde que elas se mantenham separadas em contextos diferentes, já que o público "espírita" não é informado o suficiente para juntar as peças desse quebra-cabeça.

Algumas coisas se observam. A primeira é que a obra de Allan Kardec é apenas parcialmente apreciada, de forma que apenas os pontos que agradam o "movimento espírita" sejam considerados, enquanto outros pontos mais desagradáveis são descartados, como os alertas de que espíritos levianos podem inspirar ou sugerir textos empolados para a deturpação da Doutrina Espírita.

Cria-se, no entanto, um aparato de "valorização ampla" da obra de Kardec e os deturpadores que se apoiam na fase "dúbia" do "movimento espírita" só precisam manter a seletividade temática, pegando apenas o que lhes agrada.

Assim, podem ser apreciados, por exemplo, artigos da Revista Espírita, periódico que Kardec lançou para explicar com mais detalhes as suas análises sobre a temática espírita. No entanto, observa-se que obras como A Gênese, Obras Póstumas e O Que É o Espíritismo? são raramente apreciadas.

Distribui-se tais abordagens científicas quando o assunto é ligado a uma abordagem mais rigorosa, mas sem investir em atividades feitas no Brasil. Há um cuidado em selecionar o que há de Kardec e o que há nos livros de Chico Xavier para evitar conflito, criando uma seletividade que possa parecer que haja concordância entre esses pontos de vista tão díspares e contraditórios.

Geralmente, quando os textos são de um raciocínio mais frio e objetivo, eles apelam para o cientificismo de Kardec. Mas quando a coisa vai para o lado da emotividade e dos "bons sentimentos", eis que Chico Xavier, e, em outras ocasiões, Divaldo Franco, entram para "fazer a festa".

Quando há homenagens, relatos de casos brasileiros, e quando a ideia é "defender a fraternidade e a solidariedade", o igrejismo se destaca, com toda a abordagem piegas e lacrimosa típica do deslumbramento da fé católica.

Apenas em certos contextos o igrejismo e o cientificismo se "encontram". Entre eles, quando se fala da "mediunidade" brasileira (que poucos sabem ser, na verdade, um processo de fraudes e fingimentos, pois tudo é invenção pessoal de cada "médium"), usa-se "algumas" lições de Kardec para corroborar as "práticas" feitas no Brasil.

Há também o caso das supostas profecias, quando se fala em "data-limite", "crianças-índigo", "crianças-estrelas", "era da regeneração" e tudo o mais. Aí, se narra um desfile de personalidades científicas históricas, dentro de uma abordagem em que os palestrantes capricham na ilustração de universos cósmicos ou figuras humanas que costumam ilustrar livros de Biologia.

Mas neste caso o cientificismo é falso, por ser pedante e irregular. Mistura-se argumentos científicos e filosóficos com esoterismo, e descrições sobre conhecimentos de Física e Química ou mesmo de aspectos das Ciências Humanas, como Sociologia e Antropologia, são misturados com Astrologia, sobretudo quando se fala na conjunção de um planeta com outro, da quadratura com outro planeta e outro mais adiante em tal signo etc.

Tudo são jogos de aparências e construção de uma linguagem que faz com que o "espiritismo" brasileiro ofereça uma falsa impressão de equilíbrio entre Ciência, Filosofia e Moral, trazendo, na prática, uma distribuída manipulação discursiva onde tem Pseudo-Ciência, Esoterismo e Igrejismo, a verdadeira trilogia que respalda o "espiritismo" feito no Brasil.

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