(Autor: Professor Caviar)
Uma das passagens mais dramáticas da Paixão de Cristo, encenadas na Semana Santa em várias partes do mundo, inclusive o Brasil, é nada mais do que uma ficção. O famoso julgamento de Jesus Cristo por Pôncio Pilatos, considerada uma das principais passagens da vida do ativista, simplesmente nunca existiu.
O Catolicismo inventou esse julgamento, na Idade Média, para inocentar as autoridades romanas e culpar o povo judeu pela condenação de Jesus à morte, pregado na cruz. A narrativa prevaleceu no imaginário católico e hoje muitos acreditam que o julgamento realmente existiu.
No "movimento espírita", o católico fervoroso Francisco Cândido Xavier concorda com esse mito e resolveu reproduzir o julgamento de Jesus no livro Há Dois Mil Anos, ditado pelo jesuíta Emmanuel. O livro tem sérios erros historiográficos e revela o desconhecimento de Chico Xavier e seu "mentor espiritual" da realidade vivida pelas elites e pelo povo do Império Romano.
O julgamento de Pôncio Pilatos consiste em forjar sua benevolência em relação a Jesus e sua aparente aceitação da pressão dos judeus para a condenação de Jesus. Não há lógica que os judeus teriam realmente pedido a condenação de Jesus e não há registro histórico algum que confirme esse julgamento e essa "pressão popular".
O Império Romano não iria ceder a pressões populares dessa ordem. Além disso, as autoridades eram cruéis a figuras como Jesus, considerado politicamente perigoso por causa de conversas sobre diversos assuntos quando visitava as casas das pessoas. O perfil intelectual e moral de Jesus era considerado bastante sofisticado para a época e, portanto, considerado também ameaçador ao domínio dos imperadores romanos na Judeia, onde viveu o ativista.
ACUSAÇÃO DE PLÁGIO
Há também acusações de plágio relacionadas ao livro Há Dois Mil Anos. Diante desta hipótese, até a autoria de Emmanuel se torna discutível. O livro teria sido plagiado de A Vida de Jesus, do historiador francês Ernest Renan (1823-1892), obra lançada em 1863.
O livro francês, que traz uma abordagem católica conservadora e, portanto, apresentando a versão antissemita da condenação de Jesus, teria dessa forma inspirado a produção do "relato histórico" da obra "espírita", o que neste caso pode nos trazer algumas hipóteses em torno da autoria da obra:
1) Se considerar a autoria espiritual de Emmanuel - que, quando enviava mensagens escritas a Chico Xavier, as ditava, porque o anti-médium, na verdade, não tinha concentração para fazer a "psicografia mecânica" - , sua participação teria sido parcial e, nesta tese, provavelmente Emmanuel teria autorizado Chico a "consultar" o livro de Renan para elaborar os "fatos históricos".
2) Se não considerar a autoria espiritual de Emmanuel, observa-se que o livro teria sido, portanto, mais um da parceria entre Chico Xavier e o presidente da FEB, Antônio Wantuil de Freitas - a dupla que fez os livros supostamente atribuídos a Humberto de Campos - , que recorreram ao livro de Renan para copiar sua narrativa e reorganizar o texto para parecer uma "obra mediúnica" inédita.
Há a possibilidade de Emmanuel ter ditado vários livros de Chico Xavier. Mas há também uma tese em que a comunicação entre ele e Chico Xavier se deu apenas pelo bate-papo cotidiano. Inferimos que Emmanuel pode ter ditado várias obras de Chico Xavier, mas, lembrando a fonte de Ernest Renan, o livro Há Dois Mil Anos pode não passar de um pastiche do anti-médium mineiro.
Outro fato grave é que há acusações de antissemitismo contra Ernest Renan, embora em tese ele pareça um estudioso do povo judeu. E o mais grave é que Há Dois Mil Anos, inspirado em A Vida de Jesus, foi lançado em 1939, quando o nazismo chocava o mundo com suas medidas de prisão e morte de judeus.
Em outras palavras, a obra de Chico Xavier que concordava com a tese de que os judeus foram os culpados pela morte de Jesus foi lançada no mesmo período do poder nazista, e mesmo que o antissemitismo do livro "mediúnico" e do governo de Adolf Hitler tenham sido coincidências, o fato de agirem contra o povo judeu, a partir de 1939, eram igualmente incômodos para a sociedade.
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