(Autor: Professor Caviar)
Um conhecido jurista, muito famoso em seu tempo, atuante em toda a década de 1940, foi o responsável de abrir precedente para a seletividade e o tendenciosismo da Justiça brasileira, sendo "ancestral" de uma linhagem que hoje inclui Sérgio Moro, Deltan Dallagnol, Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Carmen Lúcia e Luís Roberto Barroso, entre outros.
O juiz João Frederico Mourão Russell, também com notável carreira de produtor, era um dos mais destacados nomes do meio jurídico do então Distrito Federal, que era a cidade do Rio de Janeiro. Sendo o juiz em exercício da 8ª Vara Cível do Distrito Federal, João Frederico, no dia 23 de agosto de 1944, declarou "improcedente" o processo movido pelos herdeiros de Humberto de Campos contra a FEB e o "médium" Francisco Cândido Xavier.
A responsável principal pela ação foi a viúva do autor maranhense, Dona Catarina Vergolina de Campos, conhecida na intimidade como "Dona Paquita", e sua ação foi respaldada pelos filhos, Henrique, Humberto de Campos Filho (depois trabalhando em televisão) e Maria de Lourdes, que no entanto preferiu estar alheia ao acompanhamento jurídico.
O texto da Revista da Semana, na edição de 02 de setembro de 1944, dá a seguinte informação sobre o desfecho:
"Decidindo a questão, o ilustre magistrado afirmou que a família de Humberto de Campos não tem direito à reclamação inicial do pleito movido contra a Federação Espírita Brasileira, por haver a sua editora divulgado as obras psicografadas de Francisco Cândido Xavier, concluindo que... "a presente ação declaratória, tal como está formulada a conclusão inicial, jamais poderia ser julgada improcedente, se fosse admissível. Isto posto: julgo a suplicante carecedora da ação proposta e a condeno nas custas".
Isso significa que a ação não foi admitida e, por isso, foi considerada "improcedente". A sentença judicial lembra o esforço de dar um verniz técnico dos juízes que hoje colaboraram com o golpe político de 2016 e abriram caminho para a campanha de Jair Bolsonaro. Não por acaso, o "espiritismo" brasileiro, que exaltou a Operação Lava Jato e as passeatas do "Fora Dilma" como "iniciativas intuídas pela espiritualidade superior", tem dois juízes palestrantes, Haroldo Dutra e José Carlos de Lucca.
Na época, Milton Barbosa, advogado da família de Humberto, decidiu recorrer da sentença. Anos depois de Dona Catarina ter morrido (1951), em 1957, Chico Xavier armou um espetáculo para seduzir Humberto de Campos Filho, já atuante como produtor, diretor e jornalista de TV. Sabendo que o rapaz estava se interessando pela Doutrina Espírita (no caso, a bastarda, feita no Brasil e de conteúdo deturpado), Chico o convidou para um evento que incluiu doutrinária no Grupo Espírita da Prece, em Uberaba, e uma exibição de Assistencialismo através da caravana promovida pelo "médium", apelidada por seus seguidores de "Caravana do Amor".
Chico Xavier então resolveu dar um abraço supostamente fraterno a Humberto Filho, ato oficialmente descrito como "reconciliação" e "reconhecimento do amor e do perdão". A narrativa parece bonita, mas é um perigoso e traiçoeiro tipo de assédio moral, com os ingredientes sedutores de um assédio sexual (como o envolvimento emocional da vítima por meio de apelos "bonitos"), embora sua motivação fosse outra, de caráter religioso.
Nela, se observa uma manobra hipnótica de Chico Xavier, que usou um falsete que deixou o filho do autor maranhense bastante confuso. Isso confirma o caráter de assédio moral, com técnicas de manipulação mental através de um falsete estranho que fazia Humberto Filho pensar que se tratava "talvez" da voz do seu pai, embora o produtor de TV não tivesse certeza de ter sido a voz do seu genitor.
Complementando a sentença do juiz Mourão Russell, que aparentemente não compreendeu o caráter aberrantemente fake das supostas psicografias atribuídas ao escritor Humberto de Campos - que claramente fogem do estilo original do autor, que foi também membro da Academia Brasileira de Letras - , o assédio moral de Chico Xavier no filho de Humberto, se aproveitando de que a mãe do rapaz e viúva do escritor já havia falecido, foi um caminho em que a impunidade permitiu a idolatria religiosa.
Vale lembrar que Chico Xavier sempre foi visto com estranheza pela sociedade. Não era questão de incompreensão e "desconhecimento de um homem bom", mas pelo seu caráter pitoresco de católico ortodoxo que se dizia paranormal. Foi a habilidade de seu tutor, o presidente da FEB, Antônio Wantuil de Freitas, que com sua meticulosidade publicitária promoveu a idolatria a Chico Xavier à maneira que se trabalha a popularidade de uma armação da música pop.
Num caminho que incluiu até uma provável "queima de arquivo" - o sobrinho Amauri Xavier teria sido caluniado, vítima de maus tratos e depois envenenado depois que manifestou sua intenção de denunciar as fraudes da FEB e do próprio tio Chico - , a popularidade de Chico Xavier foi desenvolvida através de muitos recursos publicitários e com a inicial blindagem da Rede Globo de Televisão. Era para os fãs de Chico Xavier endeusarem também Assis Chateaubriand e Antônio Wantuil de Freitas.
É verdade que a imagem de Chico Xavier trabalhada pela manipulação midiática enfatizava mais o caráter pitoresco de suposto paranormal. Esse caráter foi amenizado um pouco no discurso que, após a morte de Wantuil, passou a ser feito pela Rede Globo de Televisão, que corresponde à "imagem adorável" que as pessoas têm hoje de Chico Xavier, como um pretenso filantropo e suposto mensageiro, feito à maneira de uma "fada-madrinha" da vida real.
O que temos hoje é uma série de imaginários de caráter conservador e toda uma formação de paradigmas religiosos, moralistas, jurídicos, midiáticos, hierárquicos etc que foram trazidos pelos "bons ventos" da impunidade que deixou Chico Xavier, um vergonhoso deturpador do Espiritismo, com o caminho livre para uma ascensão que, embora adotasse um discurso diferente, lembra o que se faz hoje com Jair Bolsonaro.
Ficamos nos lembrando do voto do jurista Alexandre de Moraes, originalmente ligado ao PSDB e um dos escudeiros do governo Michel Temer, e amigo do Sérgio Moro endeusado pelos "espíritas", para liberar a candidatura de Bolsonaro, ao avaliar um processo judicial sobre um comentário racista dito pelo candidato do PSL: a admissão de que os comentários de Jair "foram muito infelizes", mas que foram aceitos sob o pretexto da "liberdade de opinião".
É o que provavelmente seria a postura de Chico Xavier, que com certeza não previu o fenômeno Bolsonaro em mensagem de 1952, mas se vivo estivesse apoiaria, ainda que sob ressalvas, a candidatura do "mito", afinal o "médium" havia sido, em seu tempo, um anti-esquerdista convicto e irremediável. Chico admitiria que Bolsonaro possui algumas "posturas lamentáveis" e seus seguidores adotam "atitudes infelizes", mas o "médium" defenderia a eleição de Bolsonaro como uma "necessidade dos brasileiros de encararem certos sacrifícios".
O que certos atos podem trazer. Se não fosse a decisão, movida pelo juiz Mourão Russel sob o prisma da seletividade da Justiça brasileira, desigual e tendenciosa (ela blinda elites e ídolos religiosos), Chico Xavier teria "morrido" em 1944, tendo sido condenado ao esquecimento e ao mais profundo desprezo da sociedade, afinal as obras supostamente psicográficas que levavam o nome de Humberto eram comprovadamente fake, bastando uma simples leitura comparativa para confirmar essa aberrante realidade que muitos se recusam a aceitar.
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