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Espírita que escreve em Carta Capital comete equívocos sobre Chico Xavier


(Autor: Professor Caviar)

Mesmo quem luta para combater os desvios cometidos pelo "movimento espírita" no Brasil também cai em muitas armadilhas. O escritor espírita Franklin Félix, atuante na defesa dos direitos humanos e um dos que coordenaram a campanha de oposição ao fascista Jair Bolsonaro, havia escrito, na sua coluna publicada na Carta Capital (periódico de esquerda), na postagem de 20 de janeiro de 2018, um texto bem intencionado, mas cheio de equívocos, intitulado Brasil, coração do mundo? Os ataques aos venezuelanos desmentem.

Em primeiro lugar, costuma-se tomar como "positiva" a ideia do "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho", com base numa "tradição igrejeira" que prevalece no "espiritismo" brasileiro de tal forma que nem os contestadores da deturpação escapam, e que é contrária aos ensinamentos espíritas originais.

Em primeiro lugar, Allan Kardec não aprovava que país algum do mundo estabelecesse supremacia político-religiosa no mundo inteiro. A experiência histórica também comprovou o caráter extremamente perigoso dessa alegação. O Império Romano criou o Catolicismo sob as mesmas perspectivas "pacifistas" da tese do "Brasil, Coração do Mundo". A observação semântica combinada com a ciência política revelam que, quando um país domina o mundo, há um discurso positivo de um lado, mas há, também, a figura do "outro" a ser combatido. Nos últimos séculos, a supremacia nazista da Alemanha e o imperialismo político-econômico dos EUA mostraram o caráter macabro de países querendo dominar o mundo.

Somos "protegidos" por um ufanismo patriótico que nos faz, de maneira ingênua e enganosa, achar maravilhoso que o Brasil, sendo o nosso país, possa dominar o mundo. Não é. É perigoso e ameaçador. Do nosso lado, se faz alegações fraternas, positivas, pacifistas etc. Mas quem garante que o outro lado receberá o mesmo tratamento?

Os "espíritas" dizem que "com o Brasil, será diferente". O falso ecumenismo de um "espiritismo" catolicizado e os assédios religiosos que se faz aos ateus, visando um sutil e nunca assumido proselitismo religioso, dão a impressão de que o "coração do mundo" tratará os divergentes com carinho fraterno e espírito de tolerância e amor.

Não, não vai. O exemplo do ufanismo doentio dos bolsonaristas é só uma amostra. Quantos Torquemadas e Savonarolas não podem haver por trás do "cenário fraterno" do "Coração do Mundo"? Quem é que garantia que o Catolicismo medieval manteria seu discurso "fraterno", aparentemente trazido pelo interesse do imperador Constantino em criar uma "religião unificadora", dando a ela uma série de discursos positivos, dentro de seus contextos?

O "espiritismo" brasileiro sinaliza pelo moralismo punitivista, que até a obra de Francisco Cândido Xavier apresentou. É a ideia do sofredor aguentar suas desgraças quieto, enquanto perdoa os abusos cometidos pelos algozes. É a paz forçada da desigualdade social, do oprimido "em paz" com suas desgraças e o opressor "em paz" com seus privilégios abusivos. A caridade paliativa da ação religiosa, que apenas "previne" efeitos danosos da miséria, quase nada contribui para a superação das injustiças sociais.

Além disso, há a tese dos "resgates morais", dos "reajustes espirituais" e até das "tragédias coletivas", na qual prevalece a tese delirante de que pessoas desconhecidas entre si, só porque estiveram num mesmo lugar e num mesmo momento em que ocorreu um infortúnio ou tragédia, teriam um mesmo destino, criando a hipótese do "gado expiatório" que atribui a pessoas diferentes que morrem juntas uma suposta predestinação de "ajustes morais" atribuídas, sem fundamento científico, a faltas passadas.

Com isso, pode-se justificar, através da criminalização da vítima, bastando um simples julgamento de valor e não o fundamento científico necessário, certos holocaustos ou sentenças extremamente severas, que o "Coração do Mundo" pode trazer contra aqueles que não compartilharem de seu sistema de crenças, na verdade tão rígido e inflexível quanto o Catolicismo medieval, ao qual o "espiritismo" brasileiro depois que Chico Xavier acolheu o padre jesuíta Manuel da Nóbrega, rebatizado Emmanuel.

Além disso, uma amostra de como é o sentido macabro do "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho", às vésperas da "data-limite" citada por Xavier, é que o lema do fascista Jair Bolsonaro tem o mesmo sentido: "Brasil, acima de tudo, Deus, acima de todos". No sentido semiológico, as duas ideias são idênticas, e não há como escapar disso. Outros lemas como a frase "a minha bandeira jamais será vermelha" revelam também o lado negativo do ufanismo brasileiro, uma perigosa patriotada, com direito ao uniforme verde-amarelo da camiseta da (corrupta) CBF, que identifica os fascistas brasileiros, que andam espancando e humilhando quem não compartilha do projeto de seu ídolo Jair Bolsonaro.

Outro equívoco cometido por Franklin Félix é quanto à sua aceitação da obra fake atribuída ao espírito do escritor Humberto de Campos, cuja leitura atenta fará constatar que a "psicografia" atribuída ao autor maranhense é comprovadamente fake. Os estilos são puramente diferentes. Mas como ninguém ousa ler, e muito menos com atenção, a obra original de Humberto, deixa-se passar a obra fake, que circula hoje impunemente nas livrarias, enquanto a obra original caiu no esquecimento, fora de catálogo. Vejamos o que ele escreveu a respeito:

"Essa crença ficou muito forte a partir do lançamento, pela Federação Espírita Brasileira, em 1938, da obra mediúnica de mesmo nome, psicografada pelo médium mineiro Francisco Cândido Xavier – já desencarnado – e assinada pelo espírito Humberto de Campos, que, após batalhas judiciais entre os familiares do autor desencarnado, a FEB e o próprio Chico, passou assinar Irmão X.

No livro, o autor espiritual (Humberto de Campos) narra fatos marcantes da história brasileira, revelando planos de falanges espirituais sob o comando de Jesus e do Anjo Ismael (protetor do Brasil) no desenrolar da história mundial. É "a revelação da missão coletiva de um país", segundo o Espírito Emmanuel, mentor espiritual de Chico Xavier".

Franklin Félix, colunista de Carta Capital, deve estar por dentro das ações seletivas e parciais da Justiça brasileira. Esquece ele que as "batalhas judiciais" do processo envolvendo o autor maranhense, em 1944, tiveram desfecho trazido, de maneira irresponsável, pelo juiz João Frederico Mourão Russell, que julgou a ação dos herdeiros do escritor "improcedente", quando se observa obviamente a disparidade entre as obras "mediúnicas" e a obra original, que mostram estilos e caraterísticas completamente diferentes. O "espírito Humberto de Campos" nada tem do estilo que o autor maranhense fez marcar em sua obra deixada em vida. E há fortes indícios que o livro "patriótico" traz os estilos pessoais de Chico Xavier e Antônio Wantuil de Freitas, os verdadeiros autores de Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho.

Além disso, soa patético atribuir a Humberto uma obra risível como Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, cuja abordagem da História do Brasil remete aos piores livros didáticos, desmentindo qualquer atribuição de "obra da espiritualidade superior". A escrita do livro é cheia de falhas, e um trecho é plagiado, ridiculamente, de uma obra de sátiras humorísticas, O Brasil Anedótico, conforme se observa clicando aqui.

Outra coisa: a abordagem "espírita" de Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, na verdade, remete a Os Quatro Evangelhos, de Jean-Baptiste Roustaing - deturpador do Espiritismo também conhecido pela abreviação J. B. Roustaing, que faz "pirarem" os bolsonaristas - , que também aposta no mesmo discurso "profetista" que Chico Xavier adaptou para a realidade brasileira. Portanto, o livro ufanista de 1938 também não está de acordo com a literatura kardeciana original, pois envolve abordagens do mais profundo igrejismo medieval.

Temos que promover, sim, a tolerância, a paz e a fraternidade. Mas temos que tomar cuidado, afinal, achar que podemos combater a deturpação do Espiritismo poupando os deturpadores (e Chico Xavier foi um dos mais vergonhosos e deploráveis nessa tarefa, senão o maior deles) é acreditar na "confraternização" das ovelhas com o lobo. O Espiritismo perdeu muito quando se apostou na fusão do rebanho com a alcateia e bater na tecla dessa solução que parece agradável, mas é perigosa, só vai manter os mesmos prejuízos que, volta e meia, explodem nas crises que ameaçam a apreciação e a divulgação da verdadeira Doutrina Espírita no Brasil.

Daí que é hora dos espíritas autênticos rejeitarem os deturpadores, seja qual for a imagem agradável que eles apresentam. Erasto havia dito para repelirmos os deturpadores com firmeza e energia, porque eles são perigosos para a essência original da Doutrina Espírita, voltada à lógica e ao bom senso. Convém acatarmos esse conselho amargo, para que as promessas de recuperação das bases espíritas originais não caiam novamente na armadilha fácil do misticismo.

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