(Autor: Professor Caviar)
Na corrida para tirar a supremacia oficial da Igreja Católica nas religiões brasileiras, duas seitas concorrem através de uma campanha midiática, persuasiva e aparentemente ativista.
O neopentecostalismo, derivado da Igreja Nova Vida, do canadense radicado no Brasil Robert McAllister, hoje está representado em vários movimentos, dos quais se destacam a Assembleia de Deus, a Igreja Internacional da Graça de Deus e, sobretudo, a Igreja Universal do Reino de Deus, ela proprietária de um grande complexo midiático, comandado pela TV Record de São Paulo e que inclui também emissoras de rádio e um jornal distribuído nas igrejas da IURD.
São várias seitas, das quais figuras como R. R. Soares, Edir Macedo, Silas Malafaia e Valdomiro Santiago "convidam" os brasileiros a retornar aos padrões de vida do Velho Testamento, a partir de pregações que, no caso da IURD, se manifestam principalmente nas chamadas "novelas bíblicas".
Os neopentecostais são em parte muito influentes no Poder Legislativo nas esferas federal, estadual e municipal no Brasil. Eles compõem a chamada "bancada da Bíblia" e estão comprometidos com propostas de profundo retrocesso social e limitadas aos padrões conservadores referentes à estrutura familiar, ao mercado de trabalho e às relações amorosas.
Outro movimento religioso é, como sabemos, o "espiritismo", na prática cada vez mais afastado dos ensinamentos originais do pedagogo Allan Kardec. Entregue aos "médiuns" deturpadores, que, com seu culto à personalidade, fazem o que querem com a Doutrina Espírita e a corrompem com igrejismo que remete mais ao Catolicismo medieval.
Os astros do "espiritismo" brasileiro são bastante conhecidos. Supostos médiuns como Francisco Cândido Xavier e Divaldo Franco comandam o espetáculo. Junto a eles, outros supostos médiuns como João de Deus e José Medrado ou então palestrantes como Alamar Régis Carvalho, Orson Peter Carrara e Richard Simonetti.
Todos eles se comprometem a reduzir o legado kardeciano a uma seita igrejista, embora não sejam raras as dissimulações, pois todos se dizem "espíritas autênticos", bajulam sem escrúpulos os verdadeiros espíritas e criam um engodo ideológico que mistura igrejismo, moralismo, cientificismo e esoterismo.
Enquanto a IURD aposta na veiculação das novelas bíblicas para atrair público, o "espiritismo" brasileiro lança mão da comercialização de romances "espíritas" e nas palestras espetaculares que só falam de temas banais. Em muitos casos, a Rede Globo, que mais blinda o "espiritismo", eventualmente investe em novelas "espíritas" espalhando a visão deturpada da doutrina francesa. Vale lembrar que a Globo blinda Chico Xavier e companhia.
O "espiritismo" brasileiro apenas tem como único e relativo diferencial uma embalagem "alegre" e "despretensiosa": um suposto movimento espiritualista, combinando fé e ciência, sem maiores pretensões e marcado pela filantropia e pela simplicidade, cujo ideário é marcado por belas palavras, mensagens positivas, recados agradáveis e conselhos de aparente sabedoria.
Mas isso é só embalagem, porque o conteúdo é bastante sombrio: um moralismo bastante severo, ideologicamente ultraconservador, aliado a um igrejismo dogmatista e, se não formalmente ritualístico como na Igreja Católica, é ritualístico com mais sutileza, como na defesa do "evangelho no lar", uma simples leitura de apreciação religiosa de traduções igrejeiras do livro O Evangelho Segundo o Espiritismo de Kardec.
Para piorar, o "espiritismo" brasileiro cada vez mais caminha para trás, enfatizando mais o seu igrejismo, se formatando para ser, na prática, não a adaptação brasileira da Doutrina Espírita original, mas a repaginação do velho Catolicismo jesuíta que vigorou no Brasil colonial até meados de 1750. Diante disso, o "espiritismo" brasileiro passa a pregar ideias medievais, como a famigerada Teologia do Sofrimento, que faz apologia da desgraça humana como meio de "chegar mais perto ao Céu".
Isso coloca neopentecostais e "espíritas" num mesmo nível retrógrado. Os neopentecostais que defendem retrocessos sociais e não aceitam transformações no âmbito das relações familiares, do mercado de trabalho, das relações amorosas, se equiparam aos "espíritas" que apelam para o sofredor aceitar suas próprias desgraças, abrir mão da individualidade e das próprias necessidades vitais, para viver uma vida qualquer nota, se reduzindo a um "boneco" manipulado pelas adversidades.
Enquanto os movimentos neopentecostais focalizam a "conversão" da sociedade brasileira aos padrões religiosos do tempo de Moisés (século XVI a. C.), o "espiritismo" brasileiro quer retroceder os padrões sociais dos brasileiros para os tempos do imperador romano Constantino (século III da nossa era). Em ambos os casos, a diferença apenas se dá quanto aos contextos dos tempos atuais, com zonas urbanas, aparelhos eletrônicos, televisão, WhatsApp etc.
Aí a gente pergunta. O que é pior? O neopentecostalismo ou o "espiritismo" brasileiro? Podemos dizer que uma não é pior que a outra, mas ambas são igualmente piores, na medida em que estabelecem barreiras severas ao progresso da humanidade.
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