(Autor: Professor Caviar)
Esta frase pode parecer suave, mas é de uma hipocrisia ímpar. Afinal, Francisco Cândido Xavier tenta minimizar a influência da religião, mas fala da caridade, ou do "bem", como uma religião. O discurso não pode ser entendido ao pé-da-letra, pois os "espíritas" somente falam ao pé-da-letra quando exigem dos seus subordinados seguidores mais sacrifícios do que o normal para obterem algo parecido com "felicidade" (ou, pelo menos, algo parecido mas inferior a isso).
Vejamos então:
"Quando chegarmos ao plano espiritual, ninguém vai perguntar qual a nossa religião, mas quanto bem se praticou na Terra".
Para muitos, uma frase sublime e comovente. Quanta masturbação nos olhos se deu só com esta frase, com pessoas adotando o ato de chorar como um mero entretenimento, uma diversão, um êxtase religioso. Mas a frase mostra vários equívocos em torno de Chico Xavier que analisaremos a seguir.
Em primeiro lugar, o "espiritismo" brasileiro é catolicizado. Chico Xavier sempre foi católico, de concepções bastante ortodoxas, de tal forma que, se vemos o "médium" fazendo aparentes críticas ao Catolicismo, foi mais por questão de dor-de-cotovelo do que de rompimento com uma crença religiosa. Foi como se alguém dissesse à mulher amada: "Ingrata, odeio (sic) você, porque você não quis corresponder à minha paixão por si".
Em segundo lugar, a própria concepção de "caridade" já é religiosa, institucional. Chico Xavier era ligado ao Assistencialismo religioso, uma forma de "caridade paliativa" que envolve atos meramente pontuais e quase sempre provisórios, sem resolver profundamente as desigualdades sociais e apenas promovendo a influência religiosa e o prestígio do "benfeitor". Sendo ligado à Teologia do Sofrimento, defendida com gosto por Xavier, há até necessidade de limitar o alcance da caridade, mantendo o controle e o domínio de uma parcela de pessoas pobres.
Deste modo, a frase quer dizer que não há necessidade de se saber qual é a religião de alguém, porque o "bem" se torna essa religião, uma "caridade" igrejeira, institucionalizada ou, quando "livremente" exercida, com a pessoa se submetendo sempre a circunstâncias radicalmente adversas, movida pelos conceitos moralistas de submissão social, defendidos pela religião.
O próprio Chico Xavier não fez tão bem à sociedade quando se imagina. Suas obras "mediúnicas" são reconhecidamente fake e isso se observa através de uma leitura apurada. Os adeptos e simpatizantes de Xavier tentam enrolar, dizendo que a leitura dessas obras depende de aspectos de estudo do sobrenatural e do mundo espiritual, mas isso não faz sentido. Essas desculpas apenas servem para evitar que questionemos por que o "espírito Humberto de Campos" mais parece um padre católico do que um escritor membro da Academia Brasileira de Letras ou por que a mão do alegado autor "pesou" quando no retorno da vida espiritual.
Xavier enganou as pessoas com essas obras fake, e tudo o que ele fez foi bancar o "santo" às custas de muito sensacionalismo. Expôs as tragédias familiares como carne jogada aos leões, ou melhor, como matérias jogadas à imprensa marrom, prolongando os lutos mesmo quando da suposta esperança de que os mortos "estão bem, no outro lado", e isso ainda através de mensagens falsas nas quais até a assinatura reflete a caligrafia pessoal do "médium".
A exploração das tragédias familiares foi um mal que se vendeu, durante muitos anos, como "bem". Então, que "caridade" se pode falar no caso desta frase? Nenhuma. Em vez disso, deveríamos deixar-nos viver a vida, sem nos preocuparmos com essa frase igrejeira segundo a qual não é preciso ter uma religião, porque o "bem" da frase, a "caridade" igrejista ou moralista, já é, em si, uma religião, inspirada na concepção católica e medieval da "bondade humana".
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