(Autor: Professor Caviar)
No último dia 06, o relator do pedido de impeachment da presidenta Dilma Rousseff, o deputado federal Jovair Arantes, do PTB goiano, deu conselhos a ela assim que deixar o poder.
Em um trecho que ele, citando que "são nos momentos de crise que temos a oportunidade de trilhar um novo caminho", Jovair citou ninguém menos que o anti-médium mineiro Francisco Cândido Xavier:
"Como diz Chico Xavier, 'ninguém pode voltar atrás e fazer um novo começo. Mas qualquer um pode recomeçar e fazer um novo fim'", disse Jovair Arantes, que aliás é aliado do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, um dos que mais torcem para ver Dilma fora do Palácio do Planalto.
QUANTA INGENUIDADE
A repercussão dessa atitude pode ter sido aparentemente pequena, mas, aparentemente, desfavorável a Jovair e favorável ao "médium". Mas, nas mídias sociais, houve quem, na boa-fé, acusasse Jovair de oportunismo.
"Jovair Arantes citando Chico Xavier no processo do golpe de estado! Esculhambação!", disse Markos, do endereço @ContraGolpismo, como se tivesse esquecido que Chico Xavier defendeu a ditadura militar, numa entrevista feita para milhares de espectadores para o Pinga-Fogo da TV Tupi de São Paulo, em 1971, disponível hoje no YouTube.
Para quem não tem tempo para ver toda a entrevista, reproduzimos um comentário reacionário de Chico Xavier - sim, reacionário - no referido programa, feito numa época em que a ditadura tornou-se ainda mais violenta e revelava truculentos torturadores como Sérgio Paranhos Fleury e Brilhante Ustra.
Para quem acha que Chico Xavier nunca diria frases assim e que nunca atribuiria a ditadura militar a construção do "reino de amor" do Brasil futuro, vamos deixar aqui as frases ditas no programa, para as pessoas conferirem e confirmarem que, neste caso, foi Chico mesmo quem disse:
"Temos que convir, que os militares, em 3l de março de 1964, só deram o golpe para tomar o Poder Federal, atendendo a um apelo veemente, dramático, das famílias católicas brasileiras, tendo à frente os cardeais e os bispos. E, na verdade, com justa razão, ou melhor, com grande dose de patriotismo, porque o governo do Presidente João Goulart, de tendência francamente esquerdista, deixou instalar-se aqui no Brasil um verdadeiro caos, não só nos campos, onde as ligas camponesas (os “Sem Terra” de hoje)), desrespeitando o direito sagrado da propriedade, invadiam e tomavam à força as fazendas do interior. Da mesma forma os “sem teto”, apoderavam-se das casas e edifícios desocupados, como, infelizmente, ainda se faz hoje em dia, e ali ficavam, por tempo indeterminado. Faziam isto dirigidos e orientados pelos comunistas, que, tomando como exemplo a União Soviética e o Regime Cubano de Fidel Castro, queriam também criar aqui em nossa pátria a República do Proletariado, formada pelos trabalhadores dos campos e das cidades.
Diga-se, a bem da justiça, que os militares só recorreram à violência, ao AI-5 em represália aos atos de violência dos opositores do regime democrático capitalista, que viviam provocando atos de vandalismo, seqüestros de embaixadores e mortes de inocentes".
Só para refrescar a memória, Chico Xavier defendia a ditadura militar na mesma época em que parte da direita que a apoiou passou para a oposição. Em 1971, Carlos Lacerda já estava no exílio por ter passado a combater o regime que antes apoiou com entusiasmo ferrenho e tentou pedir a volta da democracia com a Frente Ampla ao lado do ex-desafeto Juscelino Kubitschek.
Da mesma forma, também se opusera à ditadura militar, em 1971, o católico Alceu Amoroso Lima, de origem conservadora e também defensor do golpe de 1964. Foi ele que acusou o livro Parnaso de Além-Túmulo, primeiro livro de Chico Xavier, de ter sido feito e refeito por editores da FEB, tese acidentalmente confirmada por Suely Caldas Schubert, ao divulgar uma carta do próprio Chico agradecendo editores da FEB pela revisão minuciosa do livro.
Segundo os historiadores Ângela de Castro Gomes e Jorge Ferreira (este biógrafo de João Goulart), também citaram implicitamente o apoio da federação ao golpe de 1964, no livro 1964: Um Golpe que Derrubou um Presidente.
Na página 378, sobre a Marcha da Família Unida com Deus pela Democracia, subentende-se a presença da FEB na manifestação anti-Jango. É certo que Chico Xavier também teria apoiado o golpe de 1964, com base na declaração acima:
"O que marcou a caminhada foram os grupos religiosos e, claro, as mulheres. Embora a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil não apoiasse oficialmente as Marchas, nada impedia que padres e bispos, por sua própria convicção pessoal, participassem do evento. Mas estiveram presentes também fiéis das igrejas protestantes, rabinos, espíritas kardecistas (sic) e umbandistas.
(...)
Quando a Marcha chegou ao seu destino (Vale do Anhangabaú, em São Paulo), começaram os discursos. É importante observar quem foram os oradores. Houve líderes religiosos falando em nome dos espíritas kardecistas e da Comissão de Divulgação da Imagem de Iemanjá, além de um rabino, um pastor protestante e um representante da Igreja Romana Ortodoxa".
Para quem não sabe, como esse Marko que se diz contra o impeachment da presidenta, é bom deixar claro que, naqueles idos de 1971, já atuava na guerrilha contra o regime militar uma jovem estudante chamada Dilma Rousseff, que foi presa e torturada pouco depois e, felizmente, sobreviveu.
Pois o senhor Marko deveria perceber que essa estudante é a mesma que ocupa hoje o posto de chefe do Executivo federal, ou seja, a Presidência da República, daí não ser absurdo um golpista citar uma frase de Chico Xavier. Se vivo fosse, o próprio Chico Xavier defenderia a saída de Dilma Rousseff, muito provavelmente.
A realidade é dura: Chico Xavier defendeu a ditadura.
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